Reforma Tributária: desvendando o impacto nas finanças municipais

por | 16 out, 2023 | Notícias | 0 Comentários

 Entenda como a distribuição do ICMS pode mudar e afetar as cidades

Hadassah Laís S. Santana
(Professora na Escola de Políticas Públicas e Governo da Fundação Getulio Vargas)

Marcos Aurélio Valadão
(Professor na Escola de Políticas Públicas e Governo da Fundação Getulio Vargas)

Marjorie Madoz
(Doutoranda em Economia na Fundação Getulio Vargas)

Compreender as nuances e implicações da atual proposta de Reforma Tributária em discussão no Senado Federal é crucial para delinear os possíveis desdobramentos nas finanças municipais. Atualmente, o critério determinante na partilha do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) entre os municípios é o Valor Adicionado Fiscal (VAF), que reflete o valor agregado às operações tributáveis pelo ICMS, servindo como um indicador da atividade econômica local. Essa metodologia tem fomentado a cooperação entre os entes federados e impulsionado o desenvolvimento econômico nos municípios.

A proposta de Reforma Tributária traz consigo uma mudança substancial no critério preponderante para a distribuição do ICMS. Ao atribuir maior peso à população, municípios mais densamente habitados receberiam uma parcela proporcionalmente maior. Embora, à primeira vista, essa abordagem possa parecer equitativa, é de suma importância examinar com cautela as possíveis implicações e desigualdades que tal alteração pode ocasionar.

Atualmente, a legislação em vigor leva em consideração critérios ambientais na distribuição do ICMS entre os estados. No entanto, a proposta de Reforma Tributária propõe que o critério populacional passe a ter uma preponderância significativa, relegando outros fatores, como os ambientais, a um segundo plano. Essa mudança suscita preocupações substanciais, uma vez que a estrutura consolidada e crucial na definição das políticas públicas municipais e estaduais poderia ser prejudicada. Municípios que tradicionalmente se beneficiam desses critérios agora se veriam limitados ao critério populacional. Isso certamente irá desincentivar investimentos em práticas sustentáveis e na preservação ambiental, criando um desafio nacional para o desenvolvimento sustentável em várias regiões do País.

Para exemplificar, estados como o Ceará, com seu foco em saúde e meio ambiente, demonstram um compromisso com o bem-estar da população e a preservação do ecossistema local. Da mesma forma, no Espírito Santo, a gestão avançada de saúde e o consórcio para a prestação de serviços de saúde refletem o empenho na melhoria da qualidade de vida. Esses estados e outros, que priorizam critérios ambientais em sua distribuição do ICMS, serão sem dúvida afetados pela mudança proposta na Reforma Tributária.

Com os atuais critérios da Reforma Tributária, municípios produtores como Ilha Solteira (SP) seriam duramente impactados em suas políticas públicas

Ao se analisarem os impactos da proposta da Reforma Tributária, observa-se que a mudança aprovada na Câmara dos Deputados tende a aumentar a aderência da cota-parte do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) ao tamanho populacional. No entanto, o VAF, critério orientador da distribuição da cota-parte, existente desde a instituição do antigo ICM, depois ICMS e, em breve, IBS, embora seja um critério que privilegie a colaboração com os estados e estimule o desenvolvimento econômico, deixará simplesmente de ser usado. Isto afetará negativamente uma grande quantidade de municípios produtores. Esses municípios ficarão sem recursos para a manutenção de suas infraestruturas e a quitação de outras despesas decorrentes do viés produtivo da sua economia, especialmente as relacionadas à preservação ambiental.

Ao se adotar o critério populacional como preponderante, a redistribuição pretendida impactará não apenas uma grande quantidade de municípios menos populosos, mas também percentuais significativos dos municípios altamente populosos. Oito estados (dentre eles, Goiás, Mato Grosso do Sul e Rio de Janeiro) apresentam um número maior de municípios que mais perdem do que ganham com os atuais critérios da Reforma Tributária.

A análise dos dados aponta para um viés inadequado na distribuição de recursos, sinalizando que o critério de população como fator preponderante pode carregar um aspecto puramente político-democrático, mas não eficiente. A equipe responsável pela Reforma deve agir com diligência, buscando conciliar a simplificação dos impostos com a preservação dos interesses municipais. É imperativo lembrar que o progresso econômico e social das cidades é o cerne desta iniciativa. Este é um desafio de alta relevância e impacto para o futuro do País.

As opiniões expressas neste artigo são de responsabilidade exclusiva dos autores, não refletindo necessariamente a posição institucional da FGV.

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